Elaboração de Receituário Padrão: Instrumento para Diminuição de Custos

Aline Terumi Kariyazaki, Mônica Glória Neumann Spinelli e Renata Aparecida de Almeida Moraes

O atual mercado de produção de refeições não admite mais o empirismo, pois contratos de longo prazo, com margem muito restrita de lucro e sujeitos à pressão de alta dos alimentos, exigem uma rígida fiscalização nos custos. Para tal, a padronização na produção de alimentos parece ser peça-chave para o gerenciamento e a rentabilidade do negócio, uma vez que o segmento possui características específicas que dificultam a mensuração de seus custos e intervenções sobre os mesmos (Fonseca, 2000, Reardon e Farina, 2002, Akutsu et al, 2005, Abreu et al, 2007, Duarte, 2008, Tiago, 2008).
O receituário padrão é um dos principais instrumentos de controle do restaurante, pois permite estabelecer uma programação de custos e manter um percentual para cada componente do cardápio, sem o qual é impossível estabelecer um programa de informatização adequado, que atenda amplamente à necessidade do gerenciamento dos recursos. Dentre os componentes do cardápio, o item sobremesa responde, em média, por 8 a 12% do custo do cardápio (Abreu et al, 2007).
Pelas razões citadas, este estudo se propõe a avaliar e padronizar receitas de sobremesas em uma Unidade de Alimentação e Nutrição (UAN), visando a melhoria da qualidade e a diminuição dos custos.
Método
Foram realizadas, no segundo semestre de 2008, a análise e a padronização das receitas de  sobremesas de uma UAN terceirizada, localizada no Município de São Paulo. Este serviço, por ser terceirizado, segue o contrato estabelecido e deve oferecer diariamente  nove sobremesas: gelatina diet, gelatina normal, pudim de leite condensado, bolo elaborado, sobremesa elaborada diet, sobremesa elaborada light, salada de frutas e sobremesa simples.
Depois da análise da curva ABC (ferramenta gerencial utilizada para administração de estoques, definição de política de vendas, planejamento da distribuição e programação da produção) e do cardápio, selecionaram-se as receitas de maior custo e servidas com maior freqüência. Foram excluídas as sobremesas compradas, as que utilizavam ingredientes semiprontos e as que utilizavam  como ingrediente somente frutas in natura. Do total de 40 receitas finalmente selecionadas, foi possível estabelecer o receituário padrão de 20, pois houve algumas limitações do próprio serviço que impediram a concretização de todo o processo.
Para o desenvolvimento do receituário padrão, o modo de preparo foi descrito istematicamente para a realização da receita, com detalhamento de cada etapa. Procedeu-se à análise sensorial de todas as receitas realizadas, com o intuito de garantir a aceitabilidade das preparações, e para tal foram realizados testes sensoriais de degustação simples com a equipe  de 25 funcionários da UAN.
Para o teste, realizou-se roteiro contendo classificações entre Ruim, Regular, Bom, Muito bom e Ótimo para cada item de análise sensorial: grau de dulçor, odor, sabor, textura e aparência.
Avaliou-se o custo de cada preparação, considerando as possíveis mudanças de ingredientes nas receitas. A pesagem dos ingredientes para a realização da receita foi realizada em balança digital analítica da marca Toledo®, com capacidade máxima de 15 quilogramas e sensibilidade de dois gramas.
As sobremesas foram preparadas segundo as receitas originais, para posterior comparação dos resultados e verificação das adequações necessárias. Efetuadas as alterações, as receitas foram novamente testadas para a criação do receituário padrão.
Resultados

Como se observa na Figura 1 e na Figura 2, na Tabela 1 e no Quadro 1, na consulta realizada pelo sistema ABC constatou-se que os custos planejados diferiam dos custos efetivos.
A confecção das receitas originais permitiu constatar que 70% continham erros, não permitindo  a produção das mesmas com o resultado final desejado.
Discussão

Segundo Philippi (2006), para a execução de uma receita “é imprescindível que os ingredientes   sejam medidos com precisão”. Na etapa de realização da receita original, em comparação com a receita modificada, foi possível observar que 60% das receitas continham ingredientes a mais  do que o necessário para a realização, constatando-se uma superestimação da necessidade destes ingredientes. Em contrapartida, 50% das receitas continham ingredientes subestimados, ou seja, eram ingredientes necessários à realização da receita, porém não constavam na requisição da mesma (Figura 1). Este resultado reflete diretamente nos custos, uma vez que acrescer, diminuir, aumentar e/ou retirar ingredientes na preparação pode influenciar na alteração do custo da sobremesa.
Observa-se, na Figura 2, que um total de 50% das receitas realizadas tiveram seus custos  reduzidos, frente a 35% que tiveram os custos aumentados. Esta porcentagem de aumento observada reflete a necessidade de atualizar as requisições, uma vez que a receita é preparada não conforme a requisição e sim de maneira a apresentar bons resultados e o custo já ocorre na prática.
Figura_1_-_nutri

As receitas alteradas sofreram modificações dos ingredientes para adequação da textura, do dulçor e/ou para evitar que determinado componente se sobressaísse, mascarando os demais ou produzindo um sabor ou odor indesejável. Há uma tendência em se culpar a resistência do cozinheiro ou do confeiteiro pelo não uso do receituário. Esses resultados levantam a hipótese de que isso possa até mesmo ocorrer pelo fato do erro nos receituários ser tão constante.
Deve-se considerar que uma confecção mal-sucedida gera uma perda considerável de ingredientes, de tempo e de estresse na rotina assoberbada da unidade. Empresas de prestação de serviços de alimentação e com um grande número de cozinhas devem estar atentas para esse fato, pois diferenças de custo como as encontradas neste trabalho, se reproduzidas em larga escala, trazem grandes perdas.
Aliado a isto, as receitas que utilizavam produtos não declarados na requisição evidenciam uma falha de controle de estoque. Segundo Bornia (2005), para enfrentar a nova situação mercadológica é necessário que os sistemas de gestão (planejamento) e  de informações gerenciais (controle e avaliação) adaptem-se ao novo ambiente, desenvolvendo-se novos princípios e métodos apropriados ao novo contexto. A integração entre os sistemas de planejamento e controle é essencial para o bom desempenho da empresa.
É também importante atentar para o rendimento que cada tipo de matéria-prima oferece durante uma preparação, pois certos alimentos podem sofrer interferências em sua gramatura, e podem, conseqüentemente, influir nos per capitas utilizados (Ribeiro, 2002). De modo geral, a criação de um receituário padrão influencia na qualidade final das sobremesas, com a determinação das técnicas de preparo da receita e estabelecendo as quantidades adequadas a se utilizar (Guimarães e Sousa, 2000).
A porcentagem de custos aumentada (Tabela 1) deveu-se às receitas que constam na requisição estarem incompletas, ou seja, faltavam ingredientes para o correto preparo, ou estavam com per capitas errados. Assim, afirma-se que as receitas eram teóricas e que não correspondiam à realidade da UAN. Este fato explica as diferenças encontradas na Curva ABC, sendo os custos efetivos superiores aos planejados.
Tabela_1_-_nutri
No Quadro 1, observa-se que algumas receitas não poderiam ser realizadas sem os ingredientes que foram acrescidos à receita padrão inicial, motivo do aumento de custos. Em contrapartida, a maior parte das receitas, preparadas dentro das características desejadas e com a utilização de técnicas adequadas, permitiu uma redução dos custos.
Quadro_1_-_nutri
Estas diferenças nos custos podem estar relacionadas à utilização de controles de forma matricial. Este tipo de controle pode ser positivo, pois centraliza as informações e facilita a comunicação e a transmissão dos dados, mas limita a atualização das informações, por ser um processo burocrático, não possibilitando alterar nenhuma receita, apenas incluir novas preparações, dificultando, muitas vezes, o procedimento.
Durante a realização deste estudo observou-se a importância de explorar o tema, visto que não há estudos suficientes que abordem a questão. Isto reforça a necessidade da continuidade de trabalhos neste campo, bem como o desenvolvimento de estudos complementares.
É importante enfatizar também que a criação do receituário padrão não deve ser considerada a finalização do processo. É necessário haver constantes atualizações e inclusões de novas receitas para que seja possível atender, de forma satisfatória, a crescente tendência do mercado de exigir qualidade total, afinal não é a partir de uma única receita ou de um grupo destas que se tem um receituário padrão finalizado.
Conclusão

Pode-se concluir que o receituário padrão é fundamental para o controle da qualidade e dos custos, uma vez que receitas bem elaboradas e utilizadas corretamente colaboram com a redução dos custos.
Publicado na revista Nutrição Profissional 25 (Maio/Junho 2009)

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